Voejando sobre a vida do friburguense

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

quarta-feira, 23 de abril de 2025

Depois de escrever a coluna passada sobre a riqueza imperceptível contida em cinco minutos, inspirada pelo livro “O Idiota”, de Dostoiévski, fiquei divagando antes de dormir, durante aquela hora em que conversamos com os anjos, com nosso presente, passado e futuro, até que uma ideia veio me instigar: a eternidade! Existe?! Se existe, como será? Que conceito abstrato! Entre exclamações e indagações, cheguei a uma conclusão, a mais simples e óbvia, a mais inquestionável por mim. Talvez os físicos, filósofos ou religiosos possam dar outros esclarecimentos e interpretações. A eternidade está no presente. Sim. Exatamente no instante em que estamos vivendo, interagindo com tudo e com todos, em que nosso corpo está funcionando para que possamos estar em movimento; em que a mente interpreta o que vivemos; em que os afetos reagem a nós, a tudo e a todos; e em que as vontades dão um toque especial aos modos de estar e fazer.

Estão nos menores detalhes a essência dos fatos que podem ser percebidos num piscar de olhos. Apenas um relance é suficiente para nossos canais perceptivos captarem a realidade, os afetos, os interesses, as intenções. É nessa fração de segundos que a totalidade se revela sem pudor. Nua e crua. São constatações que podem interferir nos rumos que damos à nossa vida.

Aí, pensei o que a vida do friburguense, meu povo querido, me diria? Ah!, a Praça Presidente Getúlio Vargas, por onde todos passam, me confessaria alguns segredos dos seus instantes. Ali a vida acontece todos os dias. Fazendo e refazendo sua rotina, o friburguense caminha com passos diferentes para construir sua vida, carrega suas mochilas, bolsas e sacolas, passa nos bancos, conversa com pessoas com o sotaque friburguense, sua marca registrada. A cada instante, a eternidade se faz cumprir na vida das pessoas. Como também dos animais; dos cachorros, que fazem da rua as suas casas ou que vêm de longe comer a ração que os lojistas deixam em suas portas; ou dos pássaros que voam de árvore em árvore e pousam nos bancos da praça como se fossem seus poleiros.

A sabedoria de Vinícius se revela em seus poemas: “Mas que seja infinito enquanto dure”.

A vida corre em Friburgo com largueza preenchida pela vontade de viver e sobreviver. O povo é forte. Trabalha! Trabalha e cuida da família, realizando tarefas domésticas, cumprindo responsabilidades no trabalho, empreendendo. Cuidando de si. Adquirindo saberes e experiências.

Sem a agitação dos grandes centros, o Friburguense tem vida movimentada. Acorda cedo, posto que o sol serrano não deixa a cama esquentar o corpo demais. E a vida vai acontecendo com o passar das horas em eternidades diversificadas e constantes; vêm e vão. Entre o passado e o futuro, o presente é estreito, pequeno demais, ínfimo. Mas é eterno. Ninguém o segura nas mãos, é como água que escapa pelos dedos. A fotografia, o jornalismo, o cinema, o teatro e a literatura fazem de tudo para guardar o presente. Mas ele, ao ser registrado, torna-se irreal; só pode ser observado e interpretado. Apenas quem vive o próprio instante é que o percebe na concretude do acontecer. É individual.

E o friburguense vive as suas eternidades. Sim, gosta do chão em que pisa, aprecia suas montanhas a cada olhar, sente suas águas em cada banho e come seus frutos nas refeições do dia. Guarda o orgulho de ser de Nova Friburgo. Cada um trilha seus caminhos passo a passo, olha em uma direção própria. Mas todos abraçam a cidade.

Peço a Cecília Meireles para finalizar esta coluna:

Eu canto porque o instante existe

E a minha vida está completa.

Não sou alegre nem sou triste:

sou poeta.

(1939)

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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