A trajetória de Rosalia Calamita é marcada por afetos, desafios e a permanente ligação com Nova Friburgo, cidade onde viveu a infância e mantém raízes profundas. Atualmente, ela ocupa o cargo de cônsul honorária do Brasil na Sicília, função que exerce com paixão, num trabalho que define como “a realização de um desejo de vida”.
Nascida no Rio de Janeiro, Rosalia, hoje com 68 anos, passou os primeiros anos de sua infância em Friburgo, entre os bairros Cônego e Olaria. Estudou no antigo Instituto Lúcio e no Colégio Nossa Senhora das Dores. Em 1968, aos 12 anos, mudou-se com a família para a Itália, após o golpe militar e as dificuldades econômicas que afetaram os negócios do pai, comerciante do ramo de supermercados.
“Meu pai era italiano, minha mãe brasileira. Depois do golpe, ele decidiu voltar para a Itália, onde tinha familiares que prometeram ajudá-lo”, recorda Rosalia. A chegada à Europa foi, inicialmente, deslumbrante, mas a realidade no sul do país se mostrou bem diferente: “Encontramos um lugar mais atrasado do que a nossa Nova Friburgo daquela época, que, embora pequena, nos proporcionava uma vida moderna”, recorda-se.
Como uma das primeiras brasileiras na Sicília, Rosalia enfrentou preconceito e desinformação: “Nos viam com suspeita, perguntavam se eu vivia numa cabana ou se tinha televisão”. No entanto, o amor pelo Brasil e a vontade de ajudar a comunidade brasileira na Itália sempre estiveram presentes. Até que, em 2018, surgiu a oportunidade de oficializar sua vocação. Foram 16 candidatos e, para sua surpresa, Rosalia foi escolhida. Além da experiência com traduções e projetos de voluntariado, sua paixão pelo Brasil pesou na decisão. “Eu nasci para isso”, afirma.
Desde então, desempenha com orgulho a função de cônsul honorária, um cargo não remunerado, mas que considera uma honra. A função exige dedicação, especialmente na assistência à comunidade brasileira na Sicília, que ela estima em mais de quatro mil pessoas — número subestimado, pois muitos ítalo-brasileiros não são contabilizados. “Fiz um trabalho imenso, cidade por cidade, procurando nos cartórios eleitorais pessoas nascidas no Brasil”, relata.
Um dos marcos de sua atuação foi a implantação do atendimento consular por videoconferência, que facilitou a vida dos brasileiros na Sicília. “Fui a primeira em toda a Itália a testar esse sistema. Antes, as pessoas tinham que viajar mais de 900 quilômetros até Roma”, explica. A experiência deu tão certo que foi estendida a outros consulados honorários.
Além do atendimento burocrático, Rosalia se dedica a iniciativas culturais e sociais. Promoveu cursos de italiano, convênios sobre violência de gênero, feiras de produtos artesanais e lançamentos de livros. “Tudo aquilo que envolve a nossa cultura, eu apresento para brasileiros e italianos”, resume. Um de seus projetos mais queridos é o trabalho de manutenção do português como língua de herança, realizado em parceria com outras brasileiras.
Apesar das décadas vividas na Itália, o vínculo com Nova Friburgo permanece inabalável. “Levo tudo de Nova Friburgo comigo. Meu pensamento está sempre voltado para lá”, confessa. Ela se lembra da infância despreocupada, pedalando pela Praça Getúlio Vargas e admite ter se decepcionado um pouco ao visitar a cidade em 1985: “Havia muita publicidade, muitos cartazes, a cidade não era mais aquela calma de antes”, exemplifica.
Mesmo assim, Rosalia considera Friburgo sua cidade, um lugar que ocupa um espaço central em sua identidade. “Para mim, viver na Itália ou no Brasil hoje seria a mesma coisa. Aqui tem coisas maravilhosas e terríveis, como aí também”, pondera.
Com sete anos à frente do consulado honorário e uma trajetória marcada pela determinação e pelo amor ao Brasil, Rosalia Calamita segue como uma ponte viva entre a Sicília e Nova Friburgo. Sua história é um testemunho da força das raízes e do poder de quem escolhe servir à sua comunidade, mesmo a milhares de quilômetros de casa.
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