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A escrita criativa e a voz narrativa

Tereza Cristina Malcher Campitelli
Momentos Literários
Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.
O encontro com a nossa criatividade acontece quando ainda somos bebês e brincamos com as nossas mãos e pés. Sem nada para fazer no berço e ainda com os movimentos limitados, a criança começa a inventar modos de brincar com o corpo e a própria voz ao balbuciar, gritar, chorar e rir. A cada momento, um movimento e um som vão sendo descobertos. E, por aí vai, dias a fio, o bebê começa a fazer coisas que nunca fez, deixando a criatividade despontar.
A criatividade é o mais profundo e autêntico elo com o mundo. Segundo Piaget, a infância é um tempo dourado para descobrir novas formas de ser e fazer, quando a criança enfrenta o desconhecido. São experiências difíceis que alimentam o potencial criativo existente em cada um de nós. O escritor americano Lyman Frank Baum, em “O Mágico de Oz”, nos diz que a verdadeira coragem está em enfrentar o perigo quando estamos com medo.
Superar o medo para mergulhar no desconhecido é um aprendizado. Para Donald W. Winnicot, pediatra e psicanalista inglês, a estrutura emocional é de fundamental importância para o desenvolvimento da criatividade, o ponto de partida para o viver de modo criativo e o fazer artístico.
Os pontos de encontro entre o indivíduo e o mundo são os seis sentidos: visão, audição, olfato, paladar, tato e intuição. São exatamente nessas interseções que nasce a escrita criativa: produção de textos de modo original e imaginativo. É decorrente do processo de construção da identidade individual o momento em que o escritor supera suas barreiras limitantes, liberta-se de suas restrições (como o medo de expor suas ideias através de palavras) e quebra as garras confinantes adquiridas ao longo da vida. Ele, então, devagar, de palavra em palavra, frase em frase, texto em texto, põe-se a aprender a ouvir a própria voz narrativa. É um longo e magistral aprendizado. Haja coragem e paciência para imaginar e pensar, construir ideias, escrever e reescrever.
O escritor pode experimentar vários estilos criativos, da poesia ao conto, do romance ao microconto, da crônica ao texto jornalístico, do texto dramatúrgico ao roteiro. Mas o primeiro passo é aprender a adentrar o próprio imaginário, permitindo-se escutar ideias oriundas do mundo da fantasia. É um modo de comunicação que o escritor estabelece consigo ao dialogar com suas ideias, carregadas de afetos significantes, com seus conhecimentos adquiridos e suas experiências. É o direito que ele se dá para pensar com liberdade, lidar com os próprios preconceitos, conhecer seus monstros e fadas, experimentar o uso da linguagem convencional e não convencional.
Sim, é um longo primeiro momento cheio de expectativas e espantos. É o mesmo que colocar a cara para fora das cortinas antes do espetáculo começar. Pode ser, simultaneamente, prazeroso e assustador. São momentos em que a vida ao redor se silencia para dar vazão à voz interior. Inclusive para conhecê-la. Primeiramente com cerimônia até conseguir desnudá-la. A seguir conhecê-la e aceitá-la não como nem boa ou ruim, bela ou feia, inteira ou repartida, mas como a própria voz!

Tereza Cristina Malcher Campitelli
Momentos Literários
Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.
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