Blog de terezamalcher_17966

Tempo de amar

segunda-feira, 14 de junho de 2021

Nosso calendário cuida das datas simbólicas durante o ano, e, no mês de
junho, comemoramos o Dia dos Namorados, dia em que os apaixonados saem
de mãos dadas sob as estrelas e o luar.
A literatura comemora o amor entre amantes durante o ano inteiro, ao
oferecer ao mundo romances como O Grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald,
Amor nos Tempos do Cólera, de Gabriel Garcia Marques, Diário de uma
Paixão, de Nicholas Sparks, e de milhares de outras belas e intensas histórias.
As poesias inundam o amor com doçura, como Cisnes, de Julio Salusse,

Nosso calendário cuida das datas simbólicas durante o ano, e, no mês de
junho, comemoramos o Dia dos Namorados, dia em que os apaixonados saem
de mãos dadas sob as estrelas e o luar.
A literatura comemora o amor entre amantes durante o ano inteiro, ao
oferecer ao mundo romances como O Grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald,
Amor nos Tempos do Cólera, de Gabriel Garcia Marques, Diário de uma
Paixão, de Nicholas Sparks, e de milhares de outras belas e intensas histórias.
As poesias inundam o amor com doçura, como Cisnes, de Julio Salusse,
Casamento, de Adélia Prado, Soneto da felicidade, de Vinícius de Moraes. Não
podemos nos esquecer da poesia presente nas músicas, como Amor I Love
You, de Marisa Monte, Chega de Saudade, de Vinícius de Moraes e Tom
Jobim, Você é linda, de Caetano Veloso.
Os textos, sejam em prosa ou poesia, guardam os mais fortes
sentimentos amorosos, mostrando como da alegria à sofrência o amor se faz
presente de modo especial na vida de cada um. Lendo e experimentando o
amar através da literatura, podemos perceber como é possível intensificar os
afetos saudáveis, minimizar as dificuldades no relacionamento ou superar as
dores inevitáveis.
Junho pode ser um tempo doce para quem tem seu amado ao lado, um
tempo saudoso para quem o perdeu. E esperançoso para quem sonha
amorosamente com alguém. De todo modo, os sentimentos decorrentes do
amor fazem parte da vida. Triste é quem não os sentiu. Infeliz é quem os nega
ter. Sublime é quem os permite experimentar.
Para abraçar os amantes, deixo aqui dois sonetos.

Soneto de Fidelidade

Vinícius de Moraes

De tudo, ao meu amor serei sereno
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto

Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em louvo hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ao seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama.

Eu possa me dizer (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

 

Cisnes

Julio Salusse

A vida, manso lago azul algumas
Vezes, algumas vezes mar fremente,
Tem sido para nós constantemente
Um lago azul sem ondas, sem espumas.

Sobre ele, quando, desfazendo as brumas
Matinais, rompe um sol vermelho e quente,
Nós dois vagamos indolentemente,
Como dois cisnes de alvacentas plumas.

Um dia um cisne morrerá, por certo:
Quando chegar esse momento incerto,

No lago, onde talvez a água se tisne.

Que o cisne vivo, cheio de saudade,
Nunca mais cante, nem sozinho nade,
Nem nade nunca ao lado de outro cisne!

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A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Será que a literatura pode fazer mal ao leitor?

segunda-feira, 07 de junho de 2021

Esta semana participei de uma discussão inédita no Clube Clássicos da Literatura, idealizado e coordenado por Márcia Lobosco, quando avaliávamos as repercussões que a leitura fez na vida da personagem Emma, da obra Madame Bovary, de Gustave Flaubert(*): será que a literatura pode prejudicar o leitor? 

Confesso que fiquei tomada pela pergunta ao longo da noite. Até agora, dois dias depois, para dizer a verdade. Sempre me detive nos aspectos positivos da literatura. Mas será que, por alguma razão, ela pode não fazer bem?

Esta semana participei de uma discussão inédita no Clube Clássicos da Literatura, idealizado e coordenado por Márcia Lobosco, quando avaliávamos as repercussões que a leitura fez na vida da personagem Emma, da obra Madame Bovary, de Gustave Flaubert(*): será que a literatura pode prejudicar o leitor? 

Confesso que fiquei tomada pela pergunta ao longo da noite. Até agora, dois dias depois, para dizer a verdade. Sempre me detive nos aspectos positivos da literatura. Mas será que, por alguma razão, ela pode não fazer bem?

Apesar de todas as circunstâncias poderem ser analisadas sob os pontos de vista do bem e do mal, tenho preocupações em não ficar na dualidade simplista do pensamento maniqueísta, haja vista que a literatura tem amplitude e toma os fatos da vida humana e natural com generosidade, tal qual um abraço carregado de afetos.

Talvez dois pontos de vista possam me alicerçar o pensamento neste momento, a do escritor e a do leitor. O que pode existir nessa relação? Há longos caminhos entre o inusitado e o incrível, entre o previsível e o imponderável. Entre o pensamento de um e de outro, tudo pode influenciar. Além do que entre o escritor e cada um dos seus leitores existem interações únicas. Ah, está aí a magia da literatura! Enquanto o texto é escrito, o autor é seu dono. Mas quando está pronto e disposto ao mundo, o leitor se torna proprietário soberano da obra.  

Ao escrever, o escritor faz do texto o que tiver vontade; pode construí-lo, ou modificá-lo quantas vezes que quiser. Até guardá-lo na gaveta. Ao ler, o leitor o utiliza do modo que decidir; pode escolher as raízes de uma árvore para se acomodar ou uma poltrona da varanda para ler o texto, se em forma de livro, jornal, revista ou manual. Pode repousá-lo na mesinha de cabeceira para lê-lo antes de dormir ou acordar. Pode passar o texto adiante ou esquecê-lo no banco da praça. 

O escritor e o leitor possuem uma gama de opções. Têm livre arbítrio. 

Porém, os modos pelos quais uma ideia nasce e se converte em obra literária são únicos e emergem de características especiais na história de vida de um vivente, que, por acaso ou não, decide escrever um texto. Da mesma forma, um leitor possui genuínos e diversos motivos para escolher e deter-se em uma leitura, retirando ideias de suas linhas que toquem em seus interesses, medos e formas de viver. 

    Se um texto possa vir a ser fortuito ou não na vida de um escritor ou de um leitor depende de questões pessoais. Como escritora, não gostaria de escrever histórias de terror. Como leitora, vou ter medo de ver os fantasmas que um escritor criou. 

Não é que agora senti vontade de escrever uma história? Vou começar a dançar sobre o tapete da minha sala, quem sabe ele não saia pela janela e sobrevoe as praias do Mediterrâneo? 

 

(*) Emma vivia numa pacata cidade no interior da França e, desde jovem, lia revistas e livros que abordavam a glamurosa vida de Paris. A leitura, o casamento e outras razões pessoais criaram insatisfações na personagem a ponto de torná-la inadaptada às circunstâncias nas quais estava inserida.

 

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A literatura faz a ciência voar

segunda-feira, 31 de maio de 2021

A ciência e a literatura são áreas antagônicas que se encontram desde a Antiguidade. A literatura, enquanto cuidadora do emprego das palavras e versátil no uso da linguagem, foi usada pelos três grandes campos do conhecimento científico, os das ciências humanas, biológicas e exatas, como comunicação das descobertas, teorias, princípios e relações observados e constatados. Nesta relação, coube à literatura cuidar da preservação da neutralidade, da isenção de opiniões e posicionamentos ideológicos.

A ciência e a literatura são áreas antagônicas que se encontram desde a Antiguidade. A literatura, enquanto cuidadora do emprego das palavras e versátil no uso da linguagem, foi usada pelos três grandes campos do conhecimento científico, os das ciências humanas, biológicas e exatas, como comunicação das descobertas, teorias, princípios e relações observados e constatados. Nesta relação, coube à literatura cuidar da preservação da neutralidade, da isenção de opiniões e posicionamentos ideológicos. A ela, caberia apenas, a função de revelar, através da narração e descrição objetiva dos fatos.

Deste modo, o conhecimento científico, sendo resultante da percepção e reflexão objetiva dos fatos, das suposições e constatações fundamentadas pela pesquisa, necessita da expressão literária, composta pela informalidade, pelo pensamento livre e criativo. Apesar de serem dois trabalhos intelectuais distintos, por conseguinte contraditórios, tiveram que se adequar através da dialética ao longo do tempo, ou seja, as demandas criadas pelas ciências acabaram por determinar as possibilidades literárias. 

A ciência possui um corpo de saber produzido por homens livres, que, por opção própria e de acordo com os centros de interesse individuais, debruçaram-se sobre o exercício da investigação e descoberta dos fatos da natureza física, biológica e humana. O resultado do trabalho científico tem natureza comunicável, capaz de beneficiar a todos os seres deste planeta. É, portanto, extensiva, capaz de aprimorar a história e a cultura da civilização humana.

Ante a ciência, a literatura renuncia aos diversos gêneros, como o romance, a poesia ou a crônica, para, através da prosa objetiva, falar de seus estudos. O cientista não tem comprometimento estético, não se sensibiliza com a beleza no emprego das palavras. É objetivo. Já o literato, motivado pela imaginação, vai além da realidade concreta. É subjetivo e sustentado pela sensibilidade.

Geralmente o cientista é o escritor dos seus trabalhos. Naturalmente, ele lida com a complementariedade que interliga a ciência à literatura. Enquanto cientista, é inquieto, está pronto para ir além na construção do saber. Enquanto literato, ele pode reconhecer as possibilidades e limites do texto.

As disciplinas científicas são cativantes e belas. Como Darwin, Lavoisier, Freud, Dürkheim, Piaget, Einstein e milhares de outros cientistas fizeram seus trabalhos alçarem voo através da literatura. Usando palavras, transformaram o mundo.

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Criação de textos literários

segunda-feira, 24 de maio de 2021

Um dos temas que mais gosto de abordar é o processo criativo de produção textual. Refletindo sobre esse delicado e desafiante trabalho, percebi que é iniciado com a passagem da dimensão real para a literária, que é abstrata por essência. O escritor é um vivente sensível, um ser de experiências, como todos, que guarda em seu íntimo inconformidades, desejos e necessidades em ir além para transformar o status quo. Assim, contextualizado na realidade, toma a decisão de elaborar um texto para aliviar suas inquietações, através do qual vai se manifestar linguisticamente.

Um dos temas que mais gosto de abordar é o processo criativo de produção textual. Refletindo sobre esse delicado e desafiante trabalho, percebi que é iniciado com a passagem da dimensão real para a literária, que é abstrata por essência. O escritor é um vivente sensível, um ser de experiências, como todos, que guarda em seu íntimo inconformidades, desejos e necessidades em ir além para transformar o status quo. Assim, contextualizado na realidade, toma a decisão de elaborar um texto para aliviar suas inquietações, através do qual vai se manifestar linguisticamente. Nessa construção, ele reúne conhecimentos, experiências culturais e história de vida, bem como vai precisar respeitar as características do estilo literário que escolheu para abordá-lo.

É uma passagem complexa porque o autor vai ter que comunicar de modo fidedigno, através da expressão escrita, seus sentimentos, pensamentos e opiniões. Como também, no caso de pesquisas científicas, seja no campo das exatas, biológicas ou humanas, irá elaborar demonstrações, narrativas ou descrições objetivas e imparciais.

Como a vida é ampla, oferece aos autores fartura de assuntos. A literatura, enquanto arte da palavra, tem ao seu dispor riqueza de conteúdo e de abordagens. Por razões subjetivas, o escritor escolhe um ponto de vista e um modo literário para se expressar.

O fazer literário é um processo criativo por excelência. Segundo Freud, todos nós, adultos, temos tendência a fazer poesia porque desejamos, imaginamos e, quando crianças, brincávamos. Fazíamos de conta. Porém só se tornam poetas, de fato, aqueles que não perdem na vida adulta o hábito de elaborar realidades psíquicas tais quais faziam quando crianças, quando lidavam com os momentos lúdicos com veracidade, atribuindo importância relevante ao que faziam.

Na criatividade, os processos são inteligentes na medida em que a cognição interage com a imaginação. A cognição permite que a pessoa processe informações através da percepção, decorrente de estímulos captados pelos sentidos, que se constituem em conhecimentos adquiridos na experiência e assimilados de modo subjetivo. Refletindo, integramos as informações, o que nos possibilita interpretar o mundo. Opinar. Interagir e transformar.

Já o imaginário é constituído por elementos resultantes da fantasia, de devaneios e divagações, que não possuem existência real. São idealizações. São sonhos. A criação imaginária é uma reação às situações restritivas, através da produção de imagens e pensamentos.

Se o criativo não considera a realidade concreta e apenas se utiliza do conteúdo imaginativo para refletir, tende a tornar-se alucinatório. Se, ao contrário, apenas considera a realidade concreta, as elaborações mentais podem se tornar inexpressivas, repetitivas.

Os processos mentais criativos têm inteligência dinâmica, sensível, adaptativa, maleável, fluida. Contêm a noção de passagem uma vez que possuem a intenção de transformar o que existe, de ampliar os limites cerceadores. De modificar. De gerar e parir o novo.

O fazer textual é individual e momentâneo. Inclusive o relatório de uma pesquisa científica, se escrito por dois pesquisadores distintos, terá formas diversas. E, se pelo mesmo pesquisador, for elaborada em momentos distintos, será elaborado de modos diferentes.

A produção de um texto exige do escritor a reunião de vários elementos: tempo verbal, linguagem, aplicação da língua, apresentação de ideias afins e contraditórias, desenvolvimento de um tema, construção de personagens e de narrador, fatos, história, intenções, ideologias, ambientação, dentre outros. Além de elementos básicos como objetivos, estratégias, continuidade e contiguidade.

Um texto de qualidade é elaborado com os cuidados de uma bordadeira que integra linhas de diversas cores e espessuras. Tem abrangência de ideias, emprego de uma linguagem adequada ao público-alvo e riqueza de conteúdo artisticamente entrelaçados. Inclusive os textos técnicos e ensaios.

O escritor, depois de ultrapassar todos os portais, inclusive por inúmeras revisões, considera o texto pronto. Aí, chega ao campo das libélulas, das flores coloridas. Ao bosque das surpresas e dos assombros. Da eternidade.  

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Beijo de cetim

segunda-feira, 17 de maio de 2021

Hoje darei um tom psicanalítico a esta coluna por causa de um amigo de oficina literária, Pablito, que teve o carinho de me enviar um vídeo sobre o texto “O Poeta e o Fantasiar”, escrito por Freud, em 1908.

Hoje darei um tom psicanalítico a esta coluna por causa de um amigo de oficina literária, Pablito, que teve o carinho de me enviar um vídeo sobre o texto “O Poeta e o Fantasiar”, escrito por Freud, em 1908.

O mestre da Psicanálise revela que o homem, por ser beneficiado pelas capacidades criativa e inventiva, sente-se encantado com o fantasiar, como forma de externar ou materializar seus desejos. A criação poética é, portanto, resultado desse potencial, e é possível relacioná-lo à brincadeira infantil, sempre construída por fantasias. Todos nós, humanos, somos poetas por essência, porém os que se tornam poetas de fato são aqueles que não perdem na vida adulta o hábito de elaborar realidades psíquicas tais quais faziam quando crianças, quando lidavam com os momentos lúdicos com veracidade, atribuindo importância relevante ao que faziam. Da mesma forma que o escritor quando cria narrativas literárias, seja em prosa ou poesia. Inclusive, um dos princípios básicos da ficção é a verossimilhança, ou seja, os universos ficcionais imaginados pelo autor precisam ser semelhantes à vida para dar ao leitor a impressão de concretude. 

Só se torna poeta aquele que não renuncia ao “faz de conta” infantil, que, na vida adulta, é substituído pelo fantasiar, através do sonhar diurno e noturno. Ah, no poema “Cancioneiro”, Fernando Pessoa tão bem reflete sobre o fazer poético, dando completa razão a Freud.

O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que leem o que escreve
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só as que eles não têm.

Mas assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Freud considera que tanto a brincadeira, como o poetar são atos psíquicos íntimos, atividades pessoais únicas. O fazer literário é uma forma do adulto não deixar que seus desejos fiquem ou continuem reprimidos, materializando-os através de palavras trabalhadas e cuidadas, que externam seus anseios, suas insatisfações. Poderia, neste mundo, não existir a arte? Uma atividade humana que acolhe a falta, a ausência, o medo. O enlevo.

Somos seres incompletos e desejantes, sempre em busca de prazer. O fazer poético se faz necessário para que não adoeçamos ou enlouqueçamos com os tantos desejos que guardamos, muitas vezes, desde os mais tenros momentos de vida. É um fazer que os atualiza sempre, tornando-os presentes em cada poesia e guardando-os para o futuro nos livros e arquivos. Eternizando-os.

Ao lidar com seus desejos, o escritor acaba nos presenteando com palavras, ideias, histórias. Sua dor sempre se transforma em beijos, que podem ter a maciez do cetim e a fúria dos mares. Até o gosto salgado de lágrimas infinitas.

 

 

 

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A nobreza de saber fazer o outro rir

segunda-feira, 10 de maio de 2021

Não poderia deixar de fazer uma homenagem a quem nos deu felicidade, fazendo-nos rir e gargalhar com as situações mais simples da vida. Paulo Gustavo soube extrair do quotidiano os melhores motivos para construir uma obra de humor, que tem na literatura seu ponto de partida, através da elaboração de roteiros ou textos dramatúrgicos.

Não poderia deixar de fazer uma homenagem a quem nos deu felicidade, fazendo-nos rir e gargalhar com as situações mais simples da vida. Paulo Gustavo soube extrair do quotidiano os melhores motivos para construir uma obra de humor, que tem na literatura seu ponto de partida, através da elaboração de roteiros ou textos dramatúrgicos.

Provocar risos, quiçá gargalhadas, é uma das mais desafiadoras das produções literárias. O humorista já nasce com um estado de espírito propenso a fazer o outro rir, tendo espontaneidade visceral para a comédia, que pode ser aperfeiçoada através de cursos, ensaios e de experiências direcionadas ao inusitado, ao esdrúxulo e ao equívoco. Talvez seja o estilo literário que mais exija do artista a tendência ou o talento natural, isto é, o dom cômico.

A comédia surgiu na Grécia antiga, enquanto expressão popular e sátira aos costumes da época. Paulo Gustavo correspondeu a esse princípio e buscou na própria vida familiar fatos inspiradores para escrever a trilogia Minha Mãe é Uma Peça. Texto, inclusive, publicado em estilo literário.

O autor não precisa dar muitos passos do lugar onde vive para encontrar elementos significativos que o toquem e estimulem-no a criar literatura. Certamente, embasamentos de uma formação artística se fazem necessários. Basta saber olhar, escutar, abrir os sentidos para perceber detalhes da experiência imediata, como a maneira que uma dona de casa carrega sua bolsa ou guarda o dinheiro da feira. São hábitos característicos de expressões culturais.

Paulo Gustavo exacerbou o papel desempenhado por uma dona de casa e a relação entre mãe e filhos para torná-los engraçados. Entretanto, tudo o que o filme mostra, encontra referências na realidade. Ah, quando ele repete que a vida da mulher se torna diferente depois que tem filhos, principalmente quando se tornam adolescentes, é a mais pura verdade. As agruras da maternidade. Já vou! Tô indo! Peraí! Hum... Qual mãe que não escuta tais expressões com frequência?

E quando os filhos saem de casa e deixam o “ninho” vazio. O final de domingo sem vozes, como é sofrido! Paulo Gustavo conseguiu pinçar momentos relevantes da vida de uma mãe, da dinâmica familiar, dos sentimentos que invadem a mulher no dia a dia, como irritação, ciúmes, insegurança, saudade. Até a falta de jeito.

Ele expôs o destino de uma família de classe média com humor e maestria. Contrastou a vaidade feminina com o dia a dia doméstico, fazendo emergir a comédia da rotina diária. Além de tudo, não teve medo de mostrar seu lado feminino e expor-se como mulher. Bem bonita por sinal.

Fiquei comovida com o que aconteceu com Paulo Gustavo. Doeu. Ele me passou bons sentimentos e me divertiu. Fiquei sensibilizada com seu marido e seus lindos filhos. Senti a tristeza de sua mãe me tocar, até porque tive um Beto que partiu iluminado para as estrelas.

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As estranhezas dos novos tempos

segunda-feira, 03 de maio de 2021

Aconteceu algo esta semana que não sei exatamente descrever as impressões que tive, só posso dizer que foram fortes e avassaladoras. O fato foi, para mim, inédito. Mas acredito que para outros seja uma situação vivenciada uma vez ou mais.

Como a pandemia está nos trazendo desafios!

Aconteceu algo esta semana que não sei exatamente descrever as impressões que tive, só posso dizer que foram fortes e avassaladoras. O fato foi, para mim, inédito. Mas acredito que para outros seja uma situação vivenciada uma vez ou mais.

Como a pandemia está nos trazendo desafios!

Perdi uma prima de Covid há uma semana, entre a internação e o falecimento foram quinze dias aproximadamente. Era uma pessoa animada, falante, que marcava presença em qualquer situação. Familiares e amigos acompanharam o adoecer dela com preocupação, tristeza e esperança. Mas seu estado de saúde foi se agravando, e seu tempo de vida findou. Ela tinha uma filha, Rafaela, com quem morava. Eram boas companheiras. Enfim. Depois da cremação, Rafaela trouxe a urna com as cinzas da mãe para casa, com a finalidade de aguardar o momento de lançá-las ao vento ao lado de pessoas da família, que moram em outro estado. Pela necessidade de tomar as providências iniciais, esse momento poderá demandar um tempo maior; um mês ou mais.

Confesso que este fato me tocou enormemente, uma vez que, em quinze dias, alguém com quem convivemos e amamos se torna um monte de cinzas guardadas em uma urna, que deve ficar em algum lugar da casa. Que seja num armário, numa cristaleira, numa gaveta. É uma rápida e triste metamorfose que precisamos lidar com sensatez para que a dor não nos adoeça. A vida nos faz tropeçar, entretanto essa situação pode nos ajudar a caminhar com mais equilíbrio.   

Como conviver com isso, se o findar, o momento em que a pessoa deixa de existir, na verdade, não acontece na concretude real? A pessoa, transformada em cinzas, retorna para o lugar onde vivia.

A literatura, como sempre, nos apoia nos momentos em que precisamos vivenciar o luto. Lembrei-me do livro que li de Ana Letícia leal, escrito com sensibilidade A Gente Vai se Separar. A autora externa suas emoções e lembranças nos últimos momentos em que esteve na cabeceira de sua mãe, gravemente enferma. Perder alguém por quem temos amor é um processo sofrido. Em Paula, Isabel Allende escreveu, também ao lado de sua filha Paula, em estado de coma irreversível, uma autobiografia em que a homenageia.

Se a morte acontece repentinamente, o impacto é mais forte, porém a dor não é diferente se houver um tempo de adoecimento.  Contudo, depois de todo o sofrimento, trazer para casa as cinzas de um ente querido, que seja por um, dois ou mais dias é algo indescritível. Ah, nunca me deparei afetivamente com tal circunstância como agora estou.

A médica, especializada em Cuidados Paliativos, Ana Cláudia Quintana Arantes, escreveu o livro A Morte é um Dia que Vale a Pena Viver: E um Excelente Motivo para se Buscar Um Novo Olhar para a Vida, em que aprofunda as relações entre os modos que a pessoa vive com o processo de findar. O morrer é certo, talvez a única certeza que temos em relação ao nosso futuro. Segundo a autora, o fato de aceitarmos que vamos morrer pode nos remeter à decisão de buscar a plenitude no viver. Aceitar a morte com serenidade torna-nos mais aptos a lidar com o fato de procurarmos um lugar que aconchegue uma urna em casa.  Ou até mesmo decidir que a morte, por ser um efetivo modo de extinção, não cabe ser estendida por qualquer modo, como levar um ente morto, reduzido em cinzas, para casa. Eu me sinto melhor com esta opção.

Ah, como foi bom escrever este texto. Senti-me aliviada por ter conseguido chegar a uma conclusão. Salve a literatura.

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“Minha flor é efêmera” (Saint-Exupéry)

segunda-feira, 26 de abril de 2021

Hoje é um tempo triste. Tantas pessoas estão contaminadas pelo Covid19, outras mais, internadas, além do alto índice de óbitos. Uma certa desesperança paira no ar, que nos faz perguntar: como estaremos amanhã? Sobreviveremos a uma terceira onda?

Este estado de emoção me remeteu a um trecho do livro O Pequeno Príncipe, que, tão logo o li, senti meu peito apertar.

Hoje é um tempo triste. Tantas pessoas estão contaminadas pelo Covid19, outras mais, internadas, além do alto índice de óbitos. Uma certa desesperança paira no ar, que nos faz perguntar: como estaremos amanhã? Sobreviveremos a uma terceira onda?

Este estado de emoção me remeteu a um trecho do livro O Pequeno Príncipe, que, tão logo o li, senti meu peito apertar.

— Mas o que significa “efêmeras”? — repetiu o pequeno príncipe, que, em toda sua vida, jamais desistira de uma pergunta que tenha feito.
— Significa “o que está ameaçado de desaparecer em breve”.
— Minha flor está ameaçada de desaparecer em breve?
— Certamente.
“Minha flor é efêmera, disse para si mesmo o príncipe, “e ela só tem quatro espinhos para se defender do mundo.  E eu a deixei sozinha no meu planeta!”

O livro que tenho em mãos tem a leveza da tradução de Ferreira Goulart, e o trecho a que me refiro retrata a conversa do pequeno príncipe com o geógrafo, quando visita o sexto planeta.

Com suavidade, Saint-Exupéry nos revela que somos efêmeros, sozinhos e temos de sobreviver no mundo com tão poucos recursos. Nem com toda tecnologia conquistada, hoje, no século XXI, não nos tornamos poderosos. Quem pode se defender da ventania, da inveja e de um capcioso vírus? Somos frágeis e temos poucos anos de vida. O que são 90 anos ou mesmo 100 na grandiosidade do tempo? Ninguém tem como negar que somos caracterizados pelos limites. Se olharmos para nossas mãos, percebemos que o tamanho delas é invisível aos olhos do universo. Mesmo fazendo a vida com as duas, que se completam e se ajudam. Mesmo o homem tendo construído túneis, arranha céus e trens com elas, quando vêm a avassaladora força da natureza, o poder maligno do caráter humano, elas se quebram e não conseguem superar o que diante delas se impõe.

Talvez, como Fernando Pessoa usou esta palavra!, os viventes tenham de reconhecer suas impossibilidades para conseguirem melhor enfrentar a vida. Talvez a expressão “sei que nada sei”, seja de Sócrates ou de Platão, tenha a sabedoria dos mestres. Quem não precisa conhecer e aprender mais? Pena que, às vezes, a sensação de onipotência nos engole e chegamos até a imaginar a possibilidade de sermos imortais. Há quem se esqueça de colocar máscaras quando sai à rua em plena pandemia! Será banal esquecimento ou soberba?  

Morremos. Desaparecemos. Sim. Sim, senhor, como dizia Alice. Podemos findar a qualquer momento. 

Deixo, então, o Soneto 12 de Shakespeare:

Quando conto as horas que passam no relógio,
E a noite medonha vem naufragar o dia:
Quando vejo a violeta esmaecida, E minguar seu viço, pelo tempo embranquecida;
Quando vejo as altas copas de folhagens despidas,
Que protegiam o rebanho do calor com sua sombra,
E a relva do verão atada em feixes
Ser carregada em fardos em viagem;
Então, questiono tua beleza,
Que deve fenecer com o vagar dos anos,
Como a doçura e a beleza se abandonam,
E morrem tão rápido enquanto outras crescem;
Nada detém a força do Tempo,
A não ser os filhos, para perpetuá-lo após tua partida.

 

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Entre guisos, fantasmas e girassóis

segunda-feira, 19 de abril de 2021

Por incrível que pareça, depois de mais de vinte anos escrevendo textos, livros e colunas, ainda faço oficina literária de escrita para melhorar minhas capacidades de transpor para o papel ideias, sentimentos e esperanças. O escritor é como o pianista, precisa treinar horas por dia, tal qual Gustave Flaubert fazia. Eu tinha uma vizinha, dona Lúcia, que era pianista clássica e tocava do amanhecer ao anoitecer, às vezes, os mesmos acordes de uma música, quando ela buscava a harmonia perfeita entre as notas.

Por incrível que pareça, depois de mais de vinte anos escrevendo textos, livros e colunas, ainda faço oficina literária de escrita para melhorar minhas capacidades de transpor para o papel ideias, sentimentos e esperanças. O escritor é como o pianista, precisa treinar horas por dia, tal qual Gustave Flaubert fazia. Eu tinha uma vizinha, dona Lúcia, que era pianista clássica e tocava do amanhecer ao anoitecer, às vezes, os mesmos acordes de uma música, quando ela buscava a harmonia perfeita entre as notas.

Na penúltima oficina, foi-nos sugerido escrever a respeito dos fantasmas que nos habitam e rondam. Que interessante e repugnante tema! Comecei a pensar nos meus e encontrei medos. Quem não os colecionam? Logo me lembrei de que Freud nos mostrou que somos regidos por uma instância invisivelmente preponderante, o inconsciente. Fiz esforços para adentrá-lo e, tentando, constatei que tenho medo de escrever sobre mim. Eu. Esta pessoa frágil, que usa tantos subterfúgios para fugir das ameaças que existem dentro de si.

Não apresentei texto na oficina seguinte. Aliás, costumo me proteger. Uma nova colega de oficina me espantou ao revelar que o maior abismo que tem é ter saudade de si. Ah! Pensamentos desencontrados, então, ficaram me cutucando na medida em que ia descobrindo o tamanho da saudade que sinto de mim. Inclusive, da estranha saudade de sentir falta das pessoas que guardo no meu inconsciente. Que finjo desconhecer. Ora pois, que não tem ambivalências?

Confesso que me tornei uma pessoa diferente depois que comecei a escrever. Até porque estou em cada frase, em cada palavra, revelando minhas ideias e sentimentos e, até, mesmo mostrando que escondo alguns deles. Estou viva em tudo o que escrevo. Há temas que nunca ousei escrever, como fantasmas porque vou tocar nos meus. Não gosto deles e, por isso, eles me respeitem, talvez. Por ter medo de fantasmas, meus textos sempre trazem a beleza dos girassóis, aquelas flores em forma de sol que iluminam os jardins. Por outro lado, costumo juntar ideias como o cozinheiro faz com os guisos, tão bem aceitos no dia a dia do brasileiro. Aliás o brasileiro gosta de misturar, até porque ele tem em sua essência uma diversidade de povos e cultura.

Mas preciso escrever sobre minhas faltas, lugar em que meus fantasmas habitam. Eu me acostumei a sentir falta, mas não consigo transformá-la em presença e preenchimentos. Vou vivendo, as situações vão passando. Ah, meus girassóis e meus guisos, sempre tão lindos!, vão ficando no tempo e vão me trazendo inspirações.

Agora vou me esforçar para colocar meus fantasmas na posição de abre-alas porque eles estão cansados de pedir passagem. Por certo, serei menos romântica e mais crítica. Será que conseguirei exibir minhas carnes e meus ossos com menos pudor? Nada melhor do que o tempo e as tentativas de ensaio e erro.

Fantasmas amadurecem; sempre nos trazem outras vertentes da sabedoria.

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Doces relíquias da vida

terça-feira, 13 de abril de 2021

Hoje vou escrever sobre as avós e sobre a importância que elas possuem na vida dos netos, principalmente dos que se tornam artistas e, mais especialmente ainda, dos que se tornam escritores. Esta ideia me foi tocada por uma amiga, poeta e escritora, Catherine Beltrão. Depois de viajar pela vida, trabalhar como engenheira, ter os cabelos embranquecidos, resolveu criar canteiros diferentes em seu destino, como forma de enfeitar-se com outras flores, como também eternizar a vida e a obra de sua avó, a artista plástica francesa Edith Blin (1891-1983).

Hoje vou escrever sobre as avós e sobre a importância que elas possuem na vida dos netos, principalmente dos que se tornam artistas e, mais especialmente ainda, dos que se tornam escritores. Esta ideia me foi tocada por uma amiga, poeta e escritora, Catherine Beltrão. Depois de viajar pela vida, trabalhar como engenheira, ter os cabelos embranquecidos, resolveu criar canteiros diferentes em seu destino, como forma de enfeitar-se com outras flores, como também eternizar a vida e a obra de sua avó, a artista plástica francesa Edith Blin (1891-1983). Catherine, sem timidez, se transpôs dos números para as letras e vestiu-se de furta-cor.

A relação com as avós preenche os espaços vazios da criança, decorrente de uma relação de afeto que oferece referenciais à construção da identidade de uma pessoa. Quando esta mulher, com a experiência de anos vividos, desliza seu olhar a um neto, deixa seus melhores sentimentos colorirem os momentos em que interagem.

Eu tive avós que tanto me preencheram e tanto me trouxeram segurança e felicidade. Como a avó de Catherine, foram mulheres à frente de seu tempo. Eram profissionais e independentes, tinham suas determinações de vida bem definidas e tiveram um amor imenso por mim. Como Catherine se orgulha de sua Edith! Tanto quanto eu, minha amiga foi privilegiada por ter ganho do destino uma pessoa com riqueza de ideias e de criatividade. Agora, ela, Catherine, também avó, criou o Instituto Edith Blin, que vai acolher artistas de diferentes áreas, como as da literatura, oferecendo opções variadas de atividades a serem desenvolvidas, como contação de histórias, oficinas para leitura e escrita, debate sobre obra de autores. Acredito que Catherine sinta a vida através das cores que sua avó deixou nas telas em que fez da neta sua principal modelo.

Minha avó, Carmem Temporal, era professora de canto e tradutora de livros de bolso. Passei parte da minha infância escutando o seu dedilhar numa máquina de escrever de ferro. Aquele barulho me enterneceu, ficou no meu inconsciente e, hoje, escrevo dedilhando as teclas do computador com prazer, revivendo o passado. Meu pensamento é romântico.

As histórias entre netos e avós sempre serão ternas e saudosas. Admiro Catherine por esse empenho artístico e literário, carregado de nobreza e gratidão. Por querer perpetuar os esforços de sua avó que clamou por liberdade, igualdade e fraternidade. Que engrandeceu o ser mulher.

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