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Quaresma: nossa faxina anual e a Campanha da Fraternidade

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

A Quaresma é tempo de graça, revisão de vida e conversão que a Igreja anualmente nos oferece. Anselm Grün define a Quaresma como uma “faxina anual do corpo e da alma”. Trata-se, segundo ele, “de purificação, de uma limpeza geral da nossa casa, pensando em tudo o que podemos doar ou jogar fora”. Na faxina, além de se desfazer de tudo aquilo que nos atrapalha, temos a oportunidade de encontrar e reencontrar fatos e lembranças importantes que fizeram parte de nossa vida e ficaram esquecidas no tempo.

A Quaresma é tempo de graça, revisão de vida e conversão que a Igreja anualmente nos oferece. Anselm Grün define a Quaresma como uma “faxina anual do corpo e da alma”. Trata-se, segundo ele, “de purificação, de uma limpeza geral da nossa casa, pensando em tudo o que podemos doar ou jogar fora”. Na faxina, além de se desfazer de tudo aquilo que nos atrapalha, temos a oportunidade de encontrar e reencontrar fatos e lembranças importantes que fizeram parte de nossa vida e ficaram esquecidas no tempo.

A Quaresma é um retiro que nos introduz nessa corajosa aventura de entrarmos em contato com nós mesmos, avaliando como está a nossa relação com Deus, com o próximo, com as coisas e bens. É um itinerário que permite reconhecer e acolher com sinceridade os próprios limites e pedir a Deus a força para superá-los de modo gradativo e constante. O convite para a faxina geral é uma ocasião para reorganizar a nossa casa, transformando-a num ambiente saudável, acolhedor, de contentamento e realização pessoal. Trata-se de renascer para uma vida nova, mais leve e simplificada.

Ambiente “limpo” é ambiente saudável. Saúde interior, espiritual e moral é também saúde física! Penso que esta casa seja a nossa vida interior, que define o nosso modo de ser e agir, e precisa de revisão anual, mensal, semanal e diária. Esta é a proposta de Cristo: entrar com ele no deserto, enfrentar as tentações e renascer para uma vida nova.

No Brasil, há décadas, o percurso quaresmal da Igreja Católica é acompanhado por um tema que favorece a reflexão e a conversão, proposto pela Campanha da Fraternidade. Como o próprio nome diz, trata-se de algo que favoreça a fraternidade entre os seres humanos, tendo consciência de que tudo o que fazemos por amor a Cristo e com amor, favorece e promove a vida do semelhante. Resgatar o conceito de fraternidade é um imperativo, sobretudo numa realidade marcada pela “tentação” da divisão, intolerância, desrespeito, individualismo e indiferença. Fraternidade significa viver como irmãos e irmãs, buscando a unidade na diversidade.

Hoje, mais do que antes, diante de tantas tensões e agressões, precisamos resgatar o conceito de fraternidade. Afinal, “somos todos irmãos” (Papa Francisco). Por essa razão, a Quaresma nos propõe três práticas: esmola, oração e jejum. Esmola ou caridade, diz respeito à relação com o próximo: família, colegas de trabalho, amigos, inimigos, os que pensam de modo diferente de nós, os pobres, vulneráveis e necessitados.

Já a oração acentua a importância de se ter uma constante e saudável relação com Deus, Senhor de nossa vida e de nossa história. O jejum procura melhorar a relação consigo mesmo, por meio de uma vida pautada pelo equilíbrio e temperança, sem excessos. Trata-se de um tripé que, quando bem vivenciado, oferece as condições para que sejamos melhores e cheguemos à festa da Páscoa com um coração renovado, mais humano e fraterno. É o que chamamos de conversão, mudança no modo de pensar, agir e ser.

Neste ano, a Campanha da Fraternidade será ecumênica, com o tema “Fraternidade e Diálogo: compromisso de amor”, e o lema “Cristo é a nossa paz: do que era dividido fez uma unidade”. O objetivo geral é “um convite às comunidades de fé e pessoas de boa vontade a pensarem, avaliarem e identificarem caminhos para superar as polarizações e violências através do diálogo amoroso, testemunhando a unidade na diversidade”.

Desejo a todos e todas um profícuo tempo de faxina quaresmal e desejo sincero de conversão, com respeito e vivência concreta do tema da Campanha da Fraternidade Ecumênica: “Cristo é a nossa Paz”. Para que a Quaresma seja um tempo de graça (kairótico) é necessário que seja também um tempo kenótico (esvaziamento) de tudo o que prejudica o diálogo e a unidade. Com minha benção e gratidão, unidos no amor de Cristo,

Dom Luiz Antonio Lopes Ricci é bispo diocesano de Nova Friburgo. 

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A sinceridade do coração

terça-feira, 09 de fevereiro de 2021

A liturgia do último domingo, 7, nos apresentou a figura de Jó. O homem justo e piedoso que foi acometido por grandes perdas e é conhecido em nossos ditos populares como uma pessoa paciente. Quem nunca usou ou ouvir alguém usar a expressão “paciência de Jó” ao enfrentar as provações da vida?

A liturgia do último domingo, 7, nos apresentou a figura de Jó. O homem justo e piedoso que foi acometido por grandes perdas e é conhecido em nossos ditos populares como uma pessoa paciente. Quem nunca usou ou ouvir alguém usar a expressão “paciência de Jó” ao enfrentar as provações da vida?

Contudo, as palavras destacadas pela liturgia dominical nos apresentam um homem angustiado e desesperado diante a tanta dor que recai sobre a sua vida: “Como um escravo suspira pela sombra, como um assalariado aguarda sua paga, assim tive por ganho meses de decepção, e couberam-me noites de sofrimento” (Jó 7, 2-3).

Parece uma contradição. Palavras como estas proferidas por quem é conhecido por suportar com resignação os maiores sofrimentos, injúrias e injustiças. Mas não o é!

A angústia de Jó é também a minha, a sua e de toda a humanidade. Ouvimos pela boca do profeta Jeremias que Deus tem um projeto de felicidade para nós (cf. Jr 29,11). Por isso, quando nos deparamos com a limitação, com a dor e com a finitude, é natural que nosso coração se angustie e busque respostas.

Em seu olhar atento e misericordioso, Deus não escuta as palavras proferidas por Jó como uma blasfêmia, mas como fruto da transparência de um coração que confia. A sinceridade expressada nestas circunstâncias são o modelo mais perfeito de oração, pois nela se revela a consciência sobre a própria vida e a reflexão sobre sua condição.

O catecismo da Igreja Católica, repetindo o ensinamento de Santa Teresa do Menino Jesus, afirma que “a oração é um impulso do coração, é um simples olhar lançado ao céu, um grito de reconhecimento e amor no meio da provação ou no meio da alegria” (§ 2558).

Assim, as palavras de Jó são uma perfeita oração que deve ser almejada por toda a humanidade. Modelo de uma alma que se abre totalmente a Deus como um amigo, com quem não se tem segredos.

Infelizmente, ao longo dos séculos fomos preenchendo com formalismos, ressalvas e proibições nossa relação com Deus. Transformamos nossa oração em escolhas polidas de palavras, nos esquecendo que ele é capaz de enxergar nossos corações e conhecer o que está no mais íntimo de nós, conhecendo a nós mais que nós mesmos.

Poderíamos então pensar: qual o sentido da oração? Por que haveríamos então de pedir se Deus conhece o que precisamos? Porque a oração é expressão máxima de humildade e reconhecimento do poder de Deus que tudo pode realizar em nosso favor. “A atitude de pedir deve ser tomada sobretudo por nossa causa, pois quem não pede e não quer pedir fecha-se em si mesmo” (YouCat, 486).

Enfim, a oração é, ao mesmo tempo, fruto do conhecimento de si mesmo manifestado na sinceridade e transbordamento do coração a Deus, em quem confia e se entrega. É como nos disse o Papa Francisco: “A consciência de que nas dificuldades podemos sempre dirigir-nos ao Senhor, e de que Ele jamais refuta nossas invocações, é um grande motivo de alegria” (Angelus, 16 dez. 2020).

Por isso, não podemos negar a nossa dor, ela é, na verdade, a fonte e o alimento de nossa relação com aquele que nos criou para o bem e a felicidade. E assim podemos alcançar a resposta de Deus à nossa angústia, não por palavras, mas por sua constante presença.

 

Padre Aurecir Martins de Melo Junior é coordenador diocesano da Pastoral da Comunicação. Esta coluna é publicada às terças-feiras.

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A perfeição cristã existe

terça-feira, 02 de fevereiro de 2021

Uma das mentiras contadas atualmente para nos fazer esquecer que a santidade é possível em seu estado perfeito na vida dos cristãos é essa: "esse é meu jeito, você precisa aceitar". Já refletiu sobre essa fala? Na boca de quem diz, demonstra soberba, desinteresse pela mudança, desprezo do amor e certeza de que não há o que melhorar. Aos ouvidos, soa como se fôssemos obrigados a aceitar qualquer tipo de mudanças para o melhor de nós mesmos.

Uma das mentiras contadas atualmente para nos fazer esquecer que a santidade é possível em seu estado perfeito na vida dos cristãos é essa: "esse é meu jeito, você precisa aceitar". Já refletiu sobre essa fala? Na boca de quem diz, demonstra soberba, desinteresse pela mudança, desprezo do amor e certeza de que não há o que melhorar. Aos ouvidos, soa como se fôssemos obrigados a aceitar qualquer tipo de mudanças para o melhor de nós mesmos.

Ao contrário, a vida dos santos sempre demonstrou que no início da conversão deve haver um desejo irrefreável de transformação de si mesmo, o qual é o despertar de uma nova forma de ver a meta da vida: ela foi feita para a união íntima com aquele que nos amou primeiro. E essa união é capaz de mudar tudo, pois é amor, entrega e reciprocidade. Aquele que limita sua vida ao seu “jeito de ser” não permite que o outro se introduza em sua história. É o fechamento para tudo que humaniza, pois um coração humano não foi criado para estar sozinho, ele precisa da presença do outro.

Mais uma mentira que impede de vermos a vida como um crescimento no amor e, por isso, uma mudança constante do jeito de ser, é permitir que os erros passados e a dificuldade de desapego dos mesmos se tornem um peso de culpa tão grande que impeça o olhar para a misericórdia divina, a qual é a verdade sobre nós mesmos mais que nossos tropeços.

Desfeitas as mentiras, é preciso ter uma boa disposição para a mudança. O primeiríssimo passo é a confissão dos pecados, meio ordinário para o estado de graça, de amizade com o Senhor, que garante valor para os esforços não serem em vão. O início da vida espiritual é a humilde confissão de nossas faltas graves, a luta para não voltarmos a elas e à firme resolução de desapego das coisas mundanas.

Já fez isso? Se não fez, lembre-se da brevidade da vida, da morte eterna no inferno, que são, pelo menos, meios imperfeitos para entrar no caminho da perfeição. Caso haja muito amor a Deus em você, esses passos podem ser adiantados. Geralmente, não havendo tal amor, alimente o desejo de agradar a Deus o quanto puder, que isso ajudará no desapego de tudo que possa atrapalhar.

No mais, é preciso muita força de vontade e lembrar que, hoje em dia, nem mesmo a ideia de um sofrimento eterno no inferno está causando medo nas pessoas. Quando sentem a necessidade de mudança, é porque tudo está dando errado na vida ou porque descobriram seus pecados mais escondidos, o que sugere falta de fé em Deus, que tudo vê. E já sabemos que sem fé é impossível agradar a Deus. A pessoa de fé, diante de uma decisão, se coloca, antes de tudo, perante a onisciência de Deus, pois teme o Senhor e deseja agrada-lo antes que aos homens.

Aliás, a virtude da fé não pode faltar no início da busca de perfeição, pois justamente ela nos faz enxergar a união com Deus como a verdadeira e única meta da vida. E quem começa uma jornada precisa saber para onde está indo. A fé não é escuridão, mas visão, ainda que imperfeita, do sentido da existência. Para saber se você a tem, pergunte-se: minhas mudanças têm origem em que experiência na vida? Se tudo o que te faz crer em Deus parte de situações mais ou menos desastrosas, é preciso amadurecer a fé por uma experiência íntima com o amor de Deus em Jesus Cristo.

Antes de terminar a reflexão, é preciso esclarecer que perfeição aqui não se trata de impecabilidade, ser politicamente correto, nunca se exaltar (isso é apatia) ou entrar numa forma que despreza a personalidade. Não! Ser perfeito cristão é buscar amar a Deus de todo o coração e não calcular a entrega da vida aos apelos do amor. Claro que é preciso romper com o pecado, todos sabemos (ou deveríamos saber). Mas, diante das diversas misérias humanas, o que prevalece é o amor que vai transformando.

Enfim, na oração, que nunca pode faltar na forma discursiva e apelante na vida dos iniciantes (via de regra, a maioria de nós está no início), peça a Jesus com insistência e esperança, o dom da verdadeira fé através de uma experiência de profundo perdão e amor. Quando tal experiência acontecer, o céu se abrirá, a graça chegará e os passos certos serão dados, pois a meta não será mais obscura. Coragem!

Padre Celso Henrique Diniz é vigário paroquial da Catedral São João Batista. Esta coluna é publicada às terças-feiras.

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“Eu vim pra que todos tenham vida” (Jo 10, 10)

terça-feira, 26 de janeiro de 2021

Há quase um ano, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarava que o surto causado pelo vírus SARS-CoV-2, popularmente conhecido como novo coronavírus, identificado numa província da República Popular da China, havia adquirido proporção mundial. Desde então, somos testemunhas de todos os esforços para combater a doença que se alastrava por todo o globo terrestre. Todas as atenções e preocupações voltavam-se à batalha de preservação da vida e aos colapsos sociais agravados pela pandemia.

Há quase um ano, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarava que o surto causado pelo vírus SARS-CoV-2, popularmente conhecido como novo coronavírus, identificado numa província da República Popular da China, havia adquirido proporção mundial. Desde então, somos testemunhas de todos os esforços para combater a doença que se alastrava por todo o globo terrestre. Todas as atenções e preocupações voltavam-se à batalha de preservação da vida e aos colapsos sociais agravados pela pandemia.

Tornou-se evidente que estamos imersos numa rede viciosa de interesses na qual valores como a dignidade humana, o bem comum e a preservação da vida estão sendo, cotidianamente, massacrados pela corrupção e pelo descaso. Já no início da pandemia, o Papa Francisco denunciava as ações que poderiam agravar ainda mais a situação, advertindo que deveriam ser enfrentadas com o mesmo vigor com que se propunha enfrentar o novo coronavírus.

“A tempestade desmascara a nossa vulnerabilidade e deixa a descoberto as falsas e supérfluas seguranças com que construímos os nossos programas, os nossos projetos, os nossos hábitos e prioridades. Mostra-nos como deixamos adormecido e abandonado aquilo que nutre, sustenta e dá força à nossa vida e à nossa comunidade” (Mensagem Urbi et Orbi, 27 mar. 2020).

O pontífice tem insistido que a crise mundial deve ser encarada com os anticorpos da fé, esperança e caridade. Somos chamados a exercer nosso protagonismo na luta. Apesar de todos os esforços da comunidade científica em se mobilizar no desenvolvimento da vacina, a grande massa parece não se importar com a crise e os perigos enfrentados pela humanidade.

É isso mesmo, não se pode apontar apenas um culpado para o agravamento da doença e para as incomensuráveis perdas causadas pelo vírus. De certo que cada qual deve ser responsabilizado no que diz respeito à sua função na organização da sociedade. Sem dúvidas, o discurso negacionista levou muitos a desacreditar da gravidade da doença. Entretanto, até mesmo entre os que são conscientes da seriedade da situação atual, movidos pela falta de constância, se vê atitudes irresponsáveis.

O texto bíblico do livro do Gênesis revela que uma das consequências do pecado é o isentar-se da responsabilidade. “A mulher que pusestes ao meu lado apresentou-me deste fruto, e eu comi... A serpente enganou-me – respondeu ela – e eu comi” (Gn 3, 12.13). É hora de deixar de apontar culpados e assumir nossa responsabilidade nesta luta. Tenho falado insistentemente que os pequenos atos podem salvar inúmeras vidas. A prevenção sempre será mais eficaz que o tratamento.

Retomemos, portanto, como aponta Francisco, aquilo que sustenta, nutre e dá vida à nossa comunidade. Na caridade fraterna cuidemos daqueles que nos foram confiados para que em breve possamos juntos celebrar a vitória da vida sobre a morte.

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Padre Aurecir Martins de Melo Junior é coordenador diocesano da Pastoral da Comunicação. Esta coluna é publicada às quartas-feiras. 

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Membros do mesmo corpo

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Nesta semana, fomos surpreendidos com a atordoante notícia de que faltava oxigênio no pulmão do mundo, ocasionando a morte coletiva de manauaras por asfixia. Parece absurdo, mas é a triste realidade que estamos enfrentando no país. A falta de uma das principais armas na luta para salvar vidas vítimas da Covid-19.

Nesta semana, fomos surpreendidos com a atordoante notícia de que faltava oxigênio no pulmão do mundo, ocasionando a morte coletiva de manauaras por asfixia. Parece absurdo, mas é a triste realidade que estamos enfrentando no país. A falta de uma das principais armas na luta para salvar vidas vítimas da Covid-19.

Ao mesmo tempo, como um hálito de esperança, testemunhamos a aprovação, por unanimidade, do uso emergencial de vacinas contra a enfermidade que tem assolado o mundo. Contudo, não podemos nos enganar de que a luta se encerrou. Ouvimos o diretor geral da Anvisa, a Agência de Vigilância Sanitária, Antônio Barra Torres, dizer que “o inimigo é um só. A nossa chance, a nossa melhor chance nesta guerra passa, obrigatoriamente, por uma mudança de comportamento social, sem a qual, mesmo com vacinas, a vitória não será alcançada” (17 jan. 2021).

O enfrentamento da crise deve ser assumido por todos, principalmente no que se diz respeito ao cuidado pessoal e à adoção de medidas preventivas simples, mas que podem salvar inúmeras vidas. Mais uma vez se faz necessário falar da indiferença que aflige a humanidade. Bombardeados todos os dias com inúmeras estatísticas, nos esquecemos que aqueles números são na verdade pessoas, irmãos que sofrem as consequências da falta de empatia e corresponsabilidade.

O santo padre, em entrevista para o programa Tg5 da rede de televisão italiana, advertiu que “a indiferença nos mata, porque nos afasta. Ao invés, a palavra-chave para pensar as saídas da crise é a palavra ‘proximidade’. Se não há unidade, proximidade, podem-se criar tensões sociais mesmo dentro dos estados” (10 jan. 2021).

Refletindo sobre as organizações sociais, seja na Igreja, seja na vida política, o pontífice exorta, que toda a classe governamental não tem o direito de dizer ‘eu’, mas deve sempre dizer ‘nós’ e trabalhar pela unidade diante da crise. E conclui afirmando que “um político, um pastor, um cristão, um católico, também um bispo, um sacerdote, que não tem a capacidade de dizer ‘nós’ ao invés de ‘eu’, não está à altura da situação” (idem).

Enquanto olharmos para a situação atual do país e do mundo apenas pelas estatísticas, não abriremos espaço para a compaixão. Pois compadecer-se é sofrer com. É assumir a dor do outro como própria. É sentir-se responsável. É mover-se a fazer algo para evitá-la ou ao menos amenizá-la.

Atualmente, vivenciamos alguns embates ideológicos que dificultam, ainda mais, o enfrentamento da crise. Motivados por descrenças, alguns grupos intensificam a discussão de que a vacinação, neste momento, não é uma alternativa viável. Outros, ainda, aproveitam deste evento para uma promoção pessoal e partidária, não se importando com o bem-estar social e a dignidade humana.

A este respeito, Francisco ajuizou: “Eu creio que eticamente todos devem tomar a vacina. Não é uma opção, é uma ação ética. Porque está em risco a sua saúde, a sua vida, mas também a vida dos outros”. Alcançados pelas palavras do apóstolo, lembremos que somos um só corpo e que, por isso, somos responsáveis uns pelos outros (cf. Rm 12, 5). Assim sendo, não é só sobre você, é também sobre o outro e, da mesma forma, não é só sobre o outro é também sobre você.

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Padre Aurecir Martins de Melo Junior é coordenador diocesano da Pastoral da Comunicação. Esta coluna é publicada às terças-feiras.

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Dez anos de superação

terça-feira, 12 de janeiro de 2021

Lembramos essa semana os dez anos da tragédia climática que assolou a Região Serrana do Rio de Janeiro. O dia 12 de janeiro de 2011 ficou marcado no coração e na mente de todos os que viveram e sobreviveram a este acontecimento fatídico. As marcas são visíveis e incontáveis, muitos ainda convivem com as dores e o medo, consequências de uma noite de pavor.

Friburgo foi a cidade mais atingida da região, contabilizando 429 mortes e inúmeros desabrigados. Mas, em meio ao caos, os moradores da cidade viram florescer a esperança regada pela solidariedade.

Lembramos essa semana os dez anos da tragédia climática que assolou a Região Serrana do Rio de Janeiro. O dia 12 de janeiro de 2011 ficou marcado no coração e na mente de todos os que viveram e sobreviveram a este acontecimento fatídico. As marcas são visíveis e incontáveis, muitos ainda convivem com as dores e o medo, consequências de uma noite de pavor.

Friburgo foi a cidade mais atingida da região, contabilizando 429 mortes e inúmeros desabrigados. Mas, em meio ao caos, os moradores da cidade viram florescer a esperança regada pela solidariedade.

É neste sentido que queremos relembrar aqueles dias. Valorizamos e respeitamos, sim, a dor de tantos quantos estiveram imersos não só nos escombros, mas de todos que quase submergiram sob a lama do descaso e da indiferença. Contudo, destacamos a força de superação dos friburguenses.

O mencionado dia 12 de janeiro de 2011 mudou a história da cidade. O relevo deste fato não se poderá medir somente pelo horror vivido, nem pela tristeza de tantas vidas perdidas em meio aos destroços, mas sim, pela atitude solidária de todos os moradores, superando, inclusive, perdas familiares para socorrer os que sobreviveram.

A unidade e a fraternidade foram fundamentais para alimentar a esperança de quem havia perdido tudo. A meta era reconstruir não apenas a cidade e as casas, mas principalmente os corações. Muitos abriram mão do pouco que lhes restou para partilhar com quem havia perdido até a razão de continuar a viver. As diferenças foram superadas e independente de credos e posição social todos se abraçaram na certeza de que somos irmãos.

Sem dúvida ainda há muito o que fazer. Precisamos investir nos mais diversos campos do exercício do bem comum. Coincidentemente celebramos dez anos de superação vivendo a pandemia de Covid-19, uma realidade que exige de nós os mesmos sentimentos de amor mútuo, responsabilidade e respeito.

As situações adversas de nossa história sempre revelaram o melhor e o pior da humanidade. Estejamos atentos ao que vivemos e busquemos trilhar caminhos que nos conduzem ao bem e à paz. Assim, tenhamos sempre diante de nós que a reconstrução da dignidade, o zelo pelo bem comum e a superação das dificuldades são compromissos de todos.

É o que faz ecoar as palavras do Papa Francisco: “Ou seguimos em frente pelo caminho da solidariedade ou as coisas irão piorar. Quero repetir: de uma crise não se sai como antes. A pandemia é uma crise. De uma crise, sai-se melhor ou pior. Temos que escolher. E a solidariedade é precisamente o caminho para sair melhores da crise” (Audiência Geral, 2 set. 2020).

Façamos nossa parte! E sem nos esquecermos da história, de tudo o que foi construído no passado, vivamos o presente a fim de construirmos um futuro de verdade, justiça e paz para todos.

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Recomeçar com responsabilidade

segunda-feira, 04 de janeiro de 2021

Ao iniciar um novo ano, um novo ciclo de vida, de sonhos e experiências, renasce no coração da humanidade a esperança de um futuro melhor. O ano de 2021 não seria diferente. Na verdade, a expectativa desta nova fase deu-nos forças para chegar ao fim de 2020, superando cada adversidade que nos sobreveio.

Ao iniciar um novo ano, um novo ciclo de vida, de sonhos e experiências, renasce no coração da humanidade a esperança de um futuro melhor. O ano de 2021 não seria diferente. Na verdade, a expectativa desta nova fase deu-nos forças para chegar ao fim de 2020, superando cada adversidade que nos sobreveio.

Mas, o recomeçar de um novo ano, por si só, não mudará a realidade vivida por nós. Não podemos entregar a vida e o futuro nas mãos do destino. É tempo de recomeçar e dar sentido à nossa vida, traçar metas, delinear soluções e ampliar a mente e o coração na certeza de que não estamos sozinhos e de que ninguém pode viver só.

Neste sentido, o Papa Francisco no último domingo, 3, em sua alocução ao final do Angelus chamou-nos a atenção para a responsabilidade individual, principal ferramenta para conter a disseminação da Covid-19.“Sabemos que as coisas vão melhorar na medida em que, com a ajuda de Deus, trabalharemos juntos para o bem comum, colocando no centro os mais fracos e desfavorecidos. Não sabemos o que 2021 vai nos reservar, mas o que cada um de nós e todos nós juntos podemos fazer é nos comprometer um pouco mais a cuidar uns dos outros e da criação, a nossa casa comum” (Angelus, 03 jan. 2020).

Infelizmente, neste ano em que temos alimentado nossa esperança com a descoberta das vacinas contra o novo coronavírus, também temos testemunhado o crescimento exacerbado de pensamentos e atitudes individualistas. Contudo, esta mesma esperança tem sido ceifada pelo vírus do egoísmo e da indiferença, pois a busca de interesses partidários e nacionalismos fechados, que maculam o verdadeiro valor de sermos uma família humana, tem impedido que este bem seja acessível a todos.

Neste sentido, o sumo pontífice advertiu: “Não podemos deixar que nos vença o vírus do individualismo radical, tornando-nos indiferentes ao sofrimento doutros irmãos e irmãs. Não posso passar à frente dos outros, colocando as leis do mercado e das patentes de invenção acima das leis do amor e da saúde da humanidade”. E, concluiu: “Peço a todos, nomeadamente aos líderes dos Estados, às empresas, aos organismos internacionais, que promovam a cooperação, e não a concorrência, na busca de uma solução para todos: vacinas para todos, especialmente para os mais vulneráveis e necessitados em todas as regiões da Terra. Em primeiro lugar, os mais vulneráveis e necessitados!” (Mensagem Urbi et orbi, 25 de dezembro de 2020).

Esta denúncia e apelo do santo padre, nos alerta para a necessidade de vencer a tentação de cuidar apenas dos próprios interesses, buscando satisfazer apenas o próprio prazer. Cada um de nós deve ser protagonista na batalha contra estes vírus que ameaçam a nossa sadia convivência como irmãos, herdeiros do mesmo amor de Pai. É urgente e necessário que todos nós, assumindo nosso lugar no mundo, cuidemos uns dos outros. Atitudes simples poderão salvar a vida de muitas pessoas. Cada qual cuidando de si, cuidaremos de todos.

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Padre Aurecir Martins de Melo Junior é coordenador diocesano da Pastoral da Comunicação. Esta coluna é publicada às terças-feiras.

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“Otimismo trágico”: balanço, gratidão e esperança

terça-feira, 29 de dezembro de 2020

“Ainda que a figueira não floresça, nem a vinha dê seus frutos, a oliveira não dê mais o seu azeite, nem os campos, a comida; mesmo que faltem as ovelhas nos apriscos e o gado nos currais: mesmo assim eu me alegro no Senhor, exulto em Deus, meu Salvador!” (Hab 3,17-19)

“Ainda que a figueira não floresça, nem a vinha dê seus frutos, a oliveira não dê mais o seu azeite, nem os campos, a comida; mesmo que faltem as ovelhas nos apriscos e o gado nos currais: mesmo assim eu me alegro no Senhor, exulto em Deus, meu Salvador!” (Hab 3,17-19)

Após a celebração do Natal nosso olhar se volta para o final do ano, momento de balanço pessoal e comunitário acerca das experiências vividas, comportamentos e acontecimentos relevantes, tanto os positivos, quanto os negativos. Neste ano que termina surgiu uma pandemia que parou o mundo e, ao mesmo tempo, mobilizou pesquisadores, profissionais de saúde, autoridades com poder de decisão, na busca de vacinas, medicamentos e resoluções em vista da preservação da vida e amenização dos efeitos da pandemia, especialmente na população vulnerável e empobrecida.

Não sem razão dizemos de modo uníssono: “que ano difícil”! Contudo, quase sempre, nesse período, muitas pessoas utilizam essa mesma expressão, considerando que facilmente nos esquecemos de fatos positivos e acentuamos os negativos. Na verdade, todos os anos são difíceis! Uns mais e outros menos. Este ano que termina foi dificílimo para toda a humanidade, porém para a maioria da população do Planeta e do Brasil, que luta pela sobrevivência diária, sem as mínimas condições de vida digna, todo dia de vida é um dia de vitória diante das persistentes incertezas da vida sofrida e vulnerada.

O sofrimento de toda a família humana aumentou nossa sensibilidade e comprometimento para com os “invisíveis” da sociedade. As incertezas, o medo, a insegurança, nos ajudaram a entender melhor a vida cotidiana de bilhões de seres humanos. O extraordinário para nós é o ordinário para eles. Emblemática foi a fala de um morador do Complexo da Maré, Douglas Oliveira, publicada no Jornal o Globo, em 7 de abril, que registrei no coração: “a gente convive com a realidade iminente da morte, mas uma morte visível. Agora há um perigo invisível, e isso é muito confuso. Nas favelas, dificilmente um vírus que não se vê vai assustar a ponto de colocar as pessoas dentro de casa”. Nosso desejo maior para o próximo ano é, sem dúvida, o fim da pandemia, acompanhado, é claro, do desejo de superação das injustiças sociais e desigualdades que seguem ceifando vidas. Não se trata, de modo algum, de minimizar os efeitos da pandemia, mas apenas de alargar o horizonte de reflexão, para o hoje e para o pós-pandemia. Afinal, temos e teremos sempre muito trabalho pela frente! Reiniciar ininterruptamente é preciso! Ser agradecido muito mais!

Urge recordar que o caminhar humano não é linear, mas marcado por tensões e provações. “Entre o otimismo que não sofre e o pessimismo impaciente o verdadeiro caminho do homem é este otimismo trágico no qual ele encontra sua justa medida numa atmosfera de grandeza e de luta” (E. Mounier).  A proposta de Mounier é viver o otimismo trágico, que mantêm o otimismo tão necessário, porém sem desconsiderar os dramas da vida e as inevitáveis tensões e sofrimentos, sempre ocasião de crescimento e transformação pessoal e coletiva. Otimismo adjetivado, eis a nossa proposta, e não otimismo desconectado com a realidade concreta da vida que é alegria e dor, grandeza e pequenez.

Não obstante a pandemia, dor e dificuldades, o balanço final de 2020 certamente é positivo, mesmo não tendo feito tudo o que nos propusemos a fazer no final do ano passado, tanto por conta dos nossos limites, como pelas dificuldades impostas pela pandemia.  Houve mudança de rota, mas o destino é o mesmo. Quanto aprendizado nesse período dramático! Inúmeras iniciativas surgiram, dentro e fora da Igreja, para atender aos pobres e vulneráveis. O serviço evangelizador da Igreja e as atividades caritativas prosseguiram de vários modos e maneiras, graças à incansável dedicação, fidelidade, generosidade e criatividade dos nossos padres, diáconos, leigos e leigas, nas expressões concretas do toque de Jesus e da proximidade da Igreja na vida das pessoas. Gratidão a todos e todas!

A pandemia potencializou a cultura do cuidado, nos âmbitos material, emocional, espiritual. A mensagem do Papa Francisco, para o Dia Mundial da Paz, 1° de janeiro de 2021, segue nessa direção: “escolhi como tema desta mensagem ‘a cultura do cuidado como percurso de paz’; a cultura do cuidado para erradicar a cultura da indiferença, do descarte e do conflito, que hoje muitas vezes parece prevalecer. Neste tempo, em que a barca da humanidade, sacudida pela tempestade da crise, avança com dificuldade à procura dum horizonte mais calmo e sereno, o leme da dignidade da pessoa humana e a «bússola» dos princípios sociais fundamentais podem consentir-nos de navegar com um rumo seguro e comum. Colaboremos, todos juntos, a fim de avançar para um novo horizonte de amor e paz, de fraternidade e solidariedade, de apoio mútuo e acolhimento recíproco. Não cedamos à tentação de nos desinteressarmos dos outros, especialmente dos mais frágeis, não nos habituemos a desviar o olhar, mas empenhemo-nos cada dia concretamente por formar uma comunidade feita de irmãos que se acolhem mutuamente e cuidam uns dos outros”.

No dia 31 de dezembro do ano passado, momentos antes da procissão de entrada da Santa Missa, Dom Alano Maria Penna, Arcebispo Emérito de Niterói, me disse: “Deus hoje me oferece uma folha em branco para que eu apenas assine e permita que Ele a preencha segundo a Sua Vontade”. Tratava-se de um ato de extrema confiança em Deus e de uma breve e substancial mensagem para o início do novo ano. E foi bem assim! Quando tudo parecia bem,  “de repente, não mais que de repente”, surge um vírus, uma pandemia e um cenário de distanciamento, incertezas e mortes.

Nesse horizonte, cabe a “Oração do Abandono” de Charles de Foucauld: “Meu Pai, a vós me abandono: fazei de mim o que quiserdes! O que de mim fizerdes, eu vos agradeço. Porque é para mim uma necessidade de amor, dar-me, entregar-me em vossas mãos sem medida, com infinita confiança, porque sois meu Pai”. Abandonemo-nos Nele porque Ele nunca nos abandona: “Sim, ó Senhor! De todos os modos engrandeceste e tornaste glorioso o teu povo. Nunca, em nenhum lugar, deixaste de olhar por ele e de socorrê-lo” (Sb 19,22). Chegou a hora de mais uma vez assinar a folha em branco que o Bom Deus nos oferece e deixar que Ele a escreva como Senhor da vida e da história. Vamos permanecer unidos a Ele e unidos Nele, como a jabuticaba, colada ao tronco.

Minha sincera gratidão a todos e todas, que de diversos modos, contribuíram para salvar vidas e amenizar a dor durante este dramático momento de pandemia, certamente mobilizados por diferentes motivos, dentre eles a fé, o amor concreto e o otimismo trágico ou dramático que propomos como atitude cotidiana e certamente fecunda. Em frente com paciência e perseverança! Enfrente com coragem! “Indo e vindo, trevas e luz, tudo é Graça, Deus nos conduz!”

Feliz Novo Ano!

Com minha benção, gratidão e proximidade,

Dom Luiz Antonio Lopes Ricci, bispo diocesano de Nova Friburgo

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Natal na Certeza e incertezas, na Festa e nas dores

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

“E a luz brilha nas trevas, e as trevas não a dominaram” (Jo 1,5).

“E a luz brilha nas trevas, e as trevas não a dominaram” (Jo 1,5).

Já se passaram nove meses do anúncio da pandemia em nosso país. Alguns dias depois celebramos a Anunciação do Senhor e agora nos preparamos para o Natal. Estávamos no tempo da Quaresma quando chegou o isolamento social. No início, pensávamos que seria por pouco tempo. Contudo, passamos os quatro Tempos Litúrgicos na pandemia e não obstante tanta dor, luto, incertezas e sofrimentos, permanecemos em pé, sustentados na certeza de que, Aquele que nasceu num contexto de vulnerabilidade, está Vivo, é o Senhor da vida e da história.

 Percorremos até aqui o tempo de uma gestação, durante o qual foram descobertas e testadas vacinas, que desejamos ver em breve disponíveis para toda a população. A vacina está chegando, porém, antes dela, chega Jesus que veio, vem e virá. A vacina imuniza contra o vírus. A Fé nos imuniza contra o desânimo, apesar da dor e cansaço diante de uma situação que se agrava e prolonga indefinidamente.  Nossas incertezas só encontram sentido na Certeza de que um Menino nos foi dado; Ele é o Príncipe da Paz; Deus conosco (cf. Is 9,5).

Dentro da manjedoura, com Jesus, estão as esperanças e alegrias, tristezas e angústias da humanidade. Natal é celebrar a Certeza do Amor de Deus nas incertezas da vida. “Deus amou tanto o mundo que enviou o seu Filho para nos salvar” (Jo 3,16). Por essa razão, trazemos a dor para dentro da Festa do Natal. É justamente a Festa que nos fortalece para enfrentar a dor, o luto, o cansaço e os sofrimentos decorrentes da pandemia e de tantos outros males persistentes em nossa sociedade. Sem a Festa a dor seria insuportável!

O Natal chegou num momento extremamente crítico. Sem a certeza de que Deus visitou o seu povo e permanece conosco, como enfrentaríamos esse dramático período? Diante da pandemia e da espera pela vacina, teremos que prolongar a gestação e adiar nosso parto, não o de Cristo. Ele nasce! Na verdade, estamos em contínua gestação no Útero de Deus, no qual não existe tempo cronológico, apenas Amor e Vida. Todo o tempo pandêmico está abrigado no tempo de Deus que pode criar, recriar e restaurar.

Recordemos que durante a gestação de Maria duas viagens foram realizadas: para servir Isabel e para se registrar com José. Logo após a Anunciação e o aceite generoso e corajoso da Vontade de Deus, Maria foi apressadamente servir sua prima gestante e idosa, numa longa viagem, atravessando desertos e montanhas. Também nós, no início da pandemia que coincide com a Anunciação do Senhor, não deixamos de ir ao encontro dos sofredores, pobres e vulneráveis, de diversas maneiras. 

Já perto do parto, Maria e José foram obrigados a se deslocarem para cumprir um Decreto do Imperador. Também nós, mesmo em gestação, somos “obrigados”, por respeito à vida e dever de consciência, ao distanciamento social e ao uso de máscara para evitar a proliferação do vírus.

Seguimos em nossa gestação, sem parto agendado, vivendo as incertezas na Certeza do Natal e do abraço do Menino Jesus que antecipa o abraço definitivo de Deus na Vida Eterna e os abraços tão esperados e reservados para o dia do nascimento. Prolongar a presença no Útero de Deus pode ser bom e necessário para maturar nossos pulmões e transformar o nosso coração, preparando-nos para o trabalho de parto.

Sabemos que tanto o parto pré-termo como o pós-termo podem colocar em risco a vida e causar o sofrimento fetal e materno. Contudo, na ótica da fé, o adiamento do parto, no contexto de dor, não é prejudicial, porque nossa gestação não se dá no tempo cronológico, mas no tempo kairótico (da Graça de Deus). Portanto, o parto não será pós-termo, mas na hora certa, no tempo de Deus.

Aguardemos com vigilância, coragem, paciência e perseverança. Enquanto em gestação, acolhemos agora Aquele que vem na hora certa e numa situação desfavorável, pois não havia lugar para eles (Lc 2,7). Nós, igualmente numa situação adversa, ainda que já sintamos suas dores, necessitamos aguardar o momento certo para nosso parto, pois Aquele que nasceu prepara para nós um parto humanizado e em melhores condições, para que renasçamos, após essa prolongada gestação, mais humanos e melhores.

A ocasião permite externar minha gratidão sincera a todos e todas que, de diversos modos, mesmo na pandemia, manifestaram-me acolhida, alegria e proximidade. Foram meses intensos de alegre convivência, aprendizado e crescimento. O balanço do ano que finda é positivo, porque, movidos pelo amor de Deus, somos capacitados para superar os obstáculos e situações adversas e com Maria, nossa Mãe Maior, cantar: “O Senhor fez em nós (e por meio de nós) maravilhas”! Vamos em frente, em pé, no olhar da fé!

"Dizei às pessoas deprimidas: Criai ânimo, não tenhais medo! Vede, é vosso Deus, é ele que vem para vos salvar" (Is 35,4).

Feliz Natal a todos e todas! Gratidão sempre!

Rezemos: Vem Senhor Jesus! Fica conosco Senhor! Ajude-me a ser mais santo e humano, mais humano e santo. Amém!

Dom Luiz Antonio Lopes Ricci, bispo diocesano de Nova Friburgo

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“Estai sempre alegres!” (1Ts 5,16)

terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Esta semana a liturgia da Igreja Católica celebrou o ‘Domingo Gaudete’, conhecido como o Domingo da Alegria. Isto inspirado pelas palavras do apóstolo Paulo na segunda leitura: “Estai sempre alegres!” (1Ts 5,16). É verdade que, à primeira vista, estas palavras nos incomodam profundamente. Questionamentos como: não posso me entristecer? Como ser alegre o tempo todo com tudo isto que está acontecendo ao nosso redor? São apenas alguns dos que vêm em nossa mente.

Esta semana a liturgia da Igreja Católica celebrou o ‘Domingo Gaudete’, conhecido como o Domingo da Alegria. Isto inspirado pelas palavras do apóstolo Paulo na segunda leitura: “Estai sempre alegres!” (1Ts 5,16). É verdade que, à primeira vista, estas palavras nos incomodam profundamente. Questionamentos como: não posso me entristecer? Como ser alegre o tempo todo com tudo isto que está acontecendo ao nosso redor? São apenas alguns dos que vêm em nossa mente.

Quando nos deparamos com a limitação da nossa condição humana e/ou com as dores e sofrimentos é comum, e até normal, nos entristecermos e nos abatermos. Estes sentimentos não são contrários à alegria de que fala São Paulo. Ela é capaz de sobreviver, inclusive, em meio às dificuldades. Ela subsiste sempre! É compatível com a dor, com a doença, com o fracasso e as contradições. Não é uma alegria qualquer!

O Papa Francisco advertiu, em uma de suas homilias, que a alegria deve ser a respiração do cristão. Mas, esclareceu: “A alegria não é viver de risada em risada. Não, não é isso. A alegria não é ser engraçado. Não, não é isso. É outra coisa. A alegria cristã é a paz. A paz que está nas raízes, a paz do coração, a paz que somente Deus pode nos dar. Esta é a alegria cristã. Não é fácil preservar esta alegria” (28 de mai. 2018).

As dificuldades sempre estarão presentes em nossas vidas. Contudo, estas contrariedades não podem nos roubar a alegria. Elas são uma realidade com a qual temos que conviver. E nossa alegria não pode ficar à espera de dias sem contratempos, sem tentações e dores.

O santo padre ao falar sobre a santidade no mundo atual, lembrou que “existem momentos difíceis, tempos de cruz, mas nada pode destruir a alegria sobrenatural, que ‘se adapta e transforma, mas sempre permanece pelo menos como um feixe de luz que nasce da certeza pessoal de, não obstante o contrário, sermos infinitamente amados’. É uma segurança interior, uma serenidade cheia de esperança que proporciona uma satisfação espiritual incompreensível à luz dos critérios mundanos” (Gaudete et exultate, 125).

A alegria verdadeira tem um fundamento sólido, não se apoia em coisas passageiras: notícias agradáveis, saúde, tranquilidade, situação econômica desafogada e tantas outras. Estas, sem dúvida, são coisas boas, mas não podem garantir a alegria eterna do coração. É preciso descobrirmos todos os dias que a base sólida da alegria de que nos fala o apóstolo é a certeza de que o Senhor está sempre perto de nós.

Assim, só “poderemos estar alegres se o Senhor estiver verdadeiramente presente na nossa vida, se não o tivermos perdido, se não tivermos os olhos turvados pela tibieza ou pela falta de generosidade” (Falar com Deus I, p.78). Em muitas ocasiões, principalmente em tempos difíceis como este que vivemos, é necessário nos dirigir a Deus num diálogo íntimo e sincero, abrindo nossa alma com toda confiança no Deus que se fez próximo de nós, que tocou a nossa dor. Nesta relação de amor e confiança encontraremos a fonte da verdadeira e eterna alegria. “Ainda um pouco de tempo – sem dúvida, bem pouco –, e o que há de vir virá e não tardará” (Hb 10,37) e com ele chegarão a paz e a alegria!

Foto da galeria

Padre Aurecir Martins de Melo Junior é coordenador da Pastoral da Comunicação da Diocese de Nova Friburgo. Esta coluna é publicada às terças-feiras.

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